Bloomsday: celebrando "Ulysses" de James Joyce
Hoje é 16 de junho, dia conhecido como o "Bloomsday", tanto na Irlanda, país de origem de James Joyce, autor de "Ulisses", o livro que deu origem a esta celebração, como em diversos paises do mundo: os leitores de Joyce são universais e todos querem participar da festa. A forma que o blog "Viagem de Cinema" encontrou foi dedicando este espaço a um conteúdo especial sobre o autor, o livro, a editora, o filme, a cidade de Dublin e outras curiosidades que fazem a obra de Joyce continuar tão fascinante.
James Joyce
O mais celebrado escritor irlandês de todos (pode assinar embaixo: t-o-d-o-s!) os tempos, nasceu em Dublin, em 02 de fevereiro de 1882, no berço de uma família próspera, mas que perdeu o dinheiro com o passar dos anos. Mesmo com dificuldades, Joyce foi educado em boas escolas jesuítas e na ‘University College of Dublin’.
Jovem, ele foi morar em Paris e estudar
Medicina, mas logo voltou a Dublin por conta de uma doença que acometeu sua
mãe, foi quando deixou a ideia de ser médico de lado para abraçar a sua verdadeira
vocação: a Literatura. No verão de 1904, ele conheceu Nora
Barnacle, com quem casou e teve dois filhos. Depois de morarem na Croácia (na
época, chamava-se Pola), em Trieste (antes e depois de sete meses em Roma) e em
Zurique, os Joyces retornaram à Paris, em 1920, onde permaneceram por muitos
anos. O último endereço da família foi Zurique. Ali, James Joyce faleceu em 13 de
janeiro de 1941, poucos dias antes do que seria o seu aniversário de 59 anos.
Ulysses
A estória de um dia na vida do publicitário judeu Leopold Bloom e do intelectual Stephen Dedalus foi concebida entre os anos de 1914 e 1921, um período turbulento pelo estouro da I Grande Guerra Mundial. A obra de Joyce foi inspirada no grandioso livro “Odisséia”, de Homero (que eu li quando tinha 15 anos por pura curiosidade literária. Aliás, foi o gosto pela obra do escritor grego que despertou o meu interesse pela versão do irlandês, algum tempo depois).
“Ulysses” foi, inicialmente,
publicado em capítulos pela Little Review.
Mas, diante do conteúdo - digamos! - pouco convencional (tanto para a época,
quando chegou a ser classificado como um romance erótico; como até para os dias
atuais, dependendo dos valores de quem lê o livro), a revista teve
problemas com a continuidade da publicação e não pode se responsabilizar pela
edição impressa. Eis que surge uma livreira americana na vida de Joyce...
A Shakespeare & Company
Em 1920, quando Sylvia Beach conheceu James Joyce, ela era a dona da livraria mais popular entre os autores na língua inglesa, localizada na margem esquerda do Sena: a Shakespeare & Company. A loja abriu as portas em 19 de novembro de 1919, no número 8 da rue Dupuytren e foi inspirada na versão francesa “La Maison des amis des livres”, de Adrienne Monier.
A Shakespeare & Company estava
no lugar certo (Paris) e no momento certo (no período do entre-guerras, quando
toda uma ‘geração perdida’ - de novos escritores e artistas em geral - mudou-se
para a cidade). O irlandês passou a frequentar a livraria da americana e, após
falarem sobre os fracassos de “Ulysses” para ser publicado em livro, Sylvia se
prontificou a ser a editora de Joyce. O que para ela foi um grande orgulho,
para Joyce foi um imenso alívio ver que sua obra tão cuidadosamente trabalhada
seria, finalmente, impressa.
O primeiro exemplar do livro, publicado
“na íntegra, tal como escrito”, como Sylvia frisou na ocasião, foi dado por ela a Joyce no dia do
aniversário do escritor, em 02 de fevereiro de 1922. “Ulysses” rendeu fama
internacional para o seu autor, mas não deu lucros para a sua livreira, que,
apesar dos esforços financeiros, continuou vendo o lado positivo de ter sido a
responsável por fazer a grande obra sair do – ou virar! – papel.
Bloom
“Ulysses” foi adaptado para o cinema em 2003, com Stephen Rea no papel-título, interpretando um Leopold Bloom tão convincente que fica difícil revisitar o personagem sem associa-lo ao ator.
A história trata dos
acontecimentos nas vidas de Leopold Bloom e Stephen Dedalus (interpretado por Hugh
O´Conor) durante o dia 16 de junho de 1904. Durante a sua caminhada, entrando e
saindo de lugares da cidade de Dublin, andando pelas ruas e encontrando pessoas
do seu cotidiano (umas agradáveis, outras que ele desejaria evitar), Bloom repensa
o seu relacionamento com a esposa, Molly (Angeline Ball, cujas cenas abrem e
encerram o filme) e a ideia de que ela o esteja traindo. Outro assunto que
muito o perturba é a perda do filho que, se vivo, teria 11 anos de idade.
Depois deste acontecimento, o casal deixou de manter um contato intimo como
outrora mantinham. Neste momento, entra a figura de Dedalus na vida do judeu, pois, pelo menos
para mim, Bloom transferiu para o jovem filho de um amigo seu, o carinho
paternal que não pode dar ao seu próprio filho (morto durante o parto). De qualquer forma, o seu
relacionamento com a filha de 15 anos mostra que ele foi um excelente pai.
Dedalus, por sua vez, passa o dia
perturbado pela ideia de que seja responsável pela morte da mãe, como os amigos
e familiares o acusam de ser. No seu leito de morte, ela havia pedido que Stephen
rezasse e ele, apesar de ama-la, se recusou. No dia 16 de junho, o jovem dá
aulas, visita a biblioteca da cidade para ler e discutir Hamlet,
caminha pensativo pela praia e sai com os amigos para encher a cara. Num
momento final, quando estava tão bêbado a ponto de cair na calçada, Dedalus é
ajudado por Bloom, que o leva até sua casa, serve-lhe um jantar, já que o rapaz estava sem comer há horas, e orienta-o a retornar para a casa do pai. Particularmente, achei a
cena mais emocionante e bela do filme.
Olhando assim, qual o motivo para
o grande barulho em torno de “Ulysses”? Eu atribuo ao fato de Joyce tratar o
dia de Bloom com total realismo, detalhando cenas do seu cotidiano, como a ‘sentada
no trono’ matinal, até os seus pensamentos mais profundos – seja quando está num enterro de um
amigo e a mente está em outros problemas ou, principalmente, às suas fantasias
voluptuosas com as mulheres que passam pela sua vida: a empregada doméstica, as
desconhecidas que ele encontra no açougue e na praia, as damas das ruas e dos
cabarés da cidade... Enfim, a mente do homem trabalha num ritmo alucinante (como
convenhamos dizer, a mente da maioria dos mortais).
Fiquei impressionada com a
qualidade com que o diretor Sean Walsh conseguiu passar a obra de mais de 900
páginas para a tela, sem perder a sua essência ou deixar passagens
importantes do livro de lado.
Bloomsday
A notoriedade de Ulysses encheu os irlandeses de orgulho, que trataram de considerar o dia 16 de junho como feriado nacional. Assim, todo ano, Dublin – e muitas outras cidades da Irlanda – passaram a celebrar o que chamaram de ‘Bloomsday’. Neste dia (e, às vezes, durante uma semana inteira) são feitos encontros literários, competições, exibições de séries televisivas baseadas na obra do autor, peças teatrais e tours pelos pontos da cidade citados no livro. A comemoração do ‘Bloomsday’ espalhou-se pelo mundo e chegou ao Brasil. Por aqui, já existem diversas celebrações em homenagem a obra de Joyce, sendo a mais antiga, a realizada em Santa Maria, RS, desde 1994.
A Dublin de Bloom
Os tours pelos lugares citados no
livro geralmente começam na porta do James Joyce Centre (localizado em North
Great Georges Street). Confira algumas dicas de alguns dos points mais procurados pelos turistas
e amantes do universo de Joyce & Bloom:
- A casa de Leopold e Molly Bloom
(7, Eccles Street)
- O´Connell Bridge, a ponte que
liga a parte norte da cidade à parte sul. Nela, Bloom para e joga comida para
os peixes e pensa se eles gostariam de receber ‘Maná’ (numa alusão a passagem bíblica de quando os judeus saem do Egito e se alimentam de maná).
- Dary Byrnes, na Duke Street, onde
ele almoça.
- The National Museum, Bloom passa
em frente, apressado, fugindo de um possível confronto com o amante de sua
esposa.
- Molesworth Street e Dowson Street, ponto da cidade onde Bloom ajuda um cego a atravessar a rua. No local existe uma placa indicado que a obra de Joyce passou por ali.
O melhor post com detalhes tantos dos lugares de "Ulysses", como do próprio James Joyce por Dublin, foi o feito e conhecido através do Dochara - James Joyce´s tour.
Leitores ilustres
Toda a geração perdida e diversos artistas, celebridades e intelectuais das gerações posteriores deram sinais de que leram Ulysses. Dois ilustres leitores, todavia, marcaram pontos com esta que vos escreve agora. São eles: Ernest Hemingway e Marilyn Monroe.
O ‘papa’ gostou tanto do livro
que chegou a transportá-lo, ilegalmente, para os Estados Unidos. Na época da
publicação, a obra de Joyce era considerada um atentado ao pudor e proibida em
solo americano.
Marilyn Monroe deixou-se
fotografar diversas vezes concentradíssima com o seu Ulysses nas mãos (foto acima). Algo
impensável para aqueles que viam a loira somente como um símbolo sexual.
Você sabia?
Odisseu significa Ulisses nas línguas latinas.
Dizem que no dia 16 de junho de
1904, Joyce e Nora tiveram a sua primeira noite de amor, por esta razão, a data
é tão importante para o escritor e foi escolhida para marcar um dia na vida de
Orlando Bloom.
Joyce tinha problemas na visão e
usou um tampão preto para cobrir o seu olho esquerdo. É comum, durante o ‘Bloomsday’,
ver homens caminhando por Dublin, vestindo roupas similares a do escritor e com
o tapa-olho e os óculos no rosto.
Outras obras do autor
“Dublinenses”, contos lançados em
1914.
“O retrato do artista quando
jovem”, de 1916 (Eu adoro este título, sugado na fonte da pintura).
“Finnegans Wake”, de 1939.
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Fontes de consulta: fundamentais para a composição deste post.
O livro “Ulysses”, de 2012,
editado pela Penguin Companhia, que usou a versão da Shakespeare & Company
como base.
O filme “Bloom”, de 2003, dirigido
por Sean Walsh.
“Shakespeare and Company – uma livraria
na Paris do entre-guerras”, de Sylvia Beach e “E foram todos para Paris”, de
Sérgio Augusto. Ambos publicados pela Casa da Palavra.
Visit Dublin: http://www.visitdublin.com/event/Bloomsday_Festival
DoChara: http://www.dochara.com/tour/itineraries/joyce-tour/
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